quarta-feira, 28 de março de 2007

Minhas limitações


Tem uma coisa estranha na maneira como nos relacionamos com o outro na proposta do debate. Embora inúmeras vezes eu esteja errado, escreva ou diga coisas que são, de alguma forma incorreta, tenho o hábito de provocar debate em todas as minhas relações humanas. Na maioria das vezes, deve soar como provocação ou mesmo um certo pedantismo desamparado em estudos mais aprofundados. Com certeza é assim. Certamente, a raiz desse hábito está num certo desconforto emocional ou psicológico que me catapulta, aperentemente de forma gratuita, contra o outro. Acredito ainda que meu terapeuta não dê conta dessa questão, até porque, preso de ansiedades outras e mais urgentes, não trago o assunto para as sessões.

Sou ainda refém de uma situação que acaba se tornando grave porque na maioria absoluta dos casos, minha ânsia de debater é desconsiderada pelo outro, o que me causa angústia e, principalmente, frustração. O que venho percebendo com o passar do tempo é que, por ser um movimento meu, fica natural que eu sofra a conseqüência do desprezo que o outro possa demonstrar pelo que, incomodamente, propus. Acontece também, e mais amiúde, a constatação natural de que não consigo realizar o debate de idéias por dois motivos: o outro não tem condição intelectual de aceitar ou sequer perceber a minha proposta. O outro motivo é contrário ao primeiro: o outro tem uma capacidade intelectual e acadêmica muito superior à minha e, por minha ignorância, naturalmente desconsidera a proposta do debate.

Isso acontece em várias situações, em vários momentos. Pode acontecer em qualquer dia ou qualquer hora. É um cacoete meu. Talvez eu busque na saudável discussão e troca idéias compensar um outro lado meu, insipiente e frágil que se traduz no isolamento pessoal, na falta de preparo intelectual e outras coisas que devem rolar inconscientemente. E, ainda, em algumas ocasiões, minha provocação para a discussão termina num mal estar ou mesmo uma briga, certamente porque não sei colocar meus anseios de uma forma compreensível na sua verdadeira essência, que é apenas o desejo da discussão de idéias.

Isso acontece em quase todos os dias, com as mais variadas pessoas. Escolho como exemplo então, uma troca de mensagens instantâneas na internet, ontem à noite. À propósito de um texto que escrevi em outro espaço, sobre meios de comunicação públicos, B., valorizando o que escrevi e como forma de simples diálogo, sem nenhuma intenção maior, me disse que, também como eu, existe na universidade um grupo de pessoas fazendo um trabalho interessante nessa área. Era para eu registrar a informação e dar prosseguimento a um diálogo mais ameno, próprio das conversas na internet.

Pelo tal cacoete neurótico, eu respondi que esse trabalho deveria ser feito fora da universidade. Que a sociedade, através de impostos, mantém universidades públicas para formarem acadêmicos que têm a obrigação de retribuir à mesma sociedade trazendo para esta a popularização do saber acadêmico. Que é inadmissível um debate entre acadêmicos dentro das universidades porque essa discussão intra-muros se resume a uma troca de idéias e saberes entre um mesmo número de reduzidos doutores, sem reflexo objetivo para a população que não tem acesso a essa mesma universidade.

Como, no meu texto, eu tratava de comunicação, citei na conversa (tentativa frustrada de discussão) o exemplo mais óbvio como o do Chacrinha que, sem jamais ter pisado o chão de uma universidade, através do seu trabalho exaustivo iniciado na rádio e o seu feeling e frenética busca e experimentação na televisão, conquistou uma capacidade surpreendente de comunicador de massa, criando mesmo um trabalho solitário, mas único, revolucionando o conceito de comunicação moderna. Que não se pode esperar de cada intelectual, um descobridor, porque trata-se de matéria inerente à pessoa e à formação, mas deve-se esperar sim que cada intelectual coloque-se à serviço da sociedade, promovento sempre o debate público que, pela discussão em si, cria a possibilidade de formar opiniões na população, afastando-a do imobilismo próprio da ignorância.

B. leu o que eu escrevi e, certamente por não reconhecer em mim formação adequada para essa discussão, gentilmente mudou de assunto, contando-me animada, do encontro entre amigos que proporcionarão a ela um jantar. Depois, cerimoniosamente, despediu-se e saiu. Eu fui cuidar das minhas coisas, mas aquele momento, aquela atitude delicada e correta, calou forte no meu espírito e comecei a pensar então, porquê a coisa tinha tomado aquele caminho. Foi à partir dessa minha análise que concluí o que estou dizendo: minha necessidade de discutir as coisas não é realmente natural nem aceitável (em mim), sendo, isso sim, um cacoete neurótico. Sabendo disso, cabe daqui para a frente, me policiar mais para evitar situações constrangedoras aos meus interlocutores.

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